eu, mulher; e; o espaço, público – 5

brincando com as humanidades para não dizer sobre a condição humana….

esmero sinfonico-imagem                                                             Esmero sinfónico

Me utilizo dos espaços da sala de aula, nas disciplinas, nos grupos de discussão, dos corredores, nos grupos do facebook entre outros espaços para pensar sobre a crise da universidade e os problemas que enfrentamos em 2012, neste campi.

Gostaria de pensar sobre outras coisas, que para alguns parecem mais nobre, como as grandes problemas construídos pelos sociólogos, filosófico ou dos historiadores. Ocorre que não consigo realizar tal empreendimento. Primeiro porque o modelo de universidade que temos, me apresenta ferramentas que não vejo sentido e que não sei operacionaliza-las, como a história das ciências sociais focada em três autores, Durkheim, Marx e Weber no iluminado debate da sociologia. Isso não significa que não queira saber, ou que não me interessa esse debate. Ao contrário, gostaria muito de participar desta discussão. Mas a conjuntura política em que a formação de futuro pesquisadores se coloca, dificulta tal possibilidade.

Um exemplo disso é a distância do imenso oceano que existe entre nossa conjuntura política e nossa grade, assim como os nossos sistemas de avaliação, nossa infraestrutura, nosso financiamento e nosso sistema interno e externo de exclusão. Mas como diz, o Alemão Weber, a ciência é um valor. Então como pensar na universidade, sem a propriedade do gesto de valor  cientifico? E de forma precária porque estamos sem possibilidades de ter pesquisadores vocacionados por aqui.

Penso no seguinte exemplo, imagine colocar uma indígena da comunidade dos guarani kaiowá em um apartamento de 46 metros quadrados obrigando a adquirir uma  máquina de lavar. Vamos tentar imaginar seus problemas. O primeiro, imagino de ordem subjetiva, é como explicar para essa indígena que é benéfico lavar roupa em uma máquina pois assim  ganhará tempo? Bom, vamos supor que nós consigamos explica-la a ideia de tempo ocidental moderna e aja uma aceitação de sua parte pelo uso. Suponhamos também que depois de muitos problemas ocorra uma compra.

Enfim a indígena e a máquina. Então os problemas seriam de como operar tal  instrumento.  Podemos mostrar a ela, o manual de instruções. Acontece que ela não sabe ler. Contudo o que esta em questão são os enunciados simbólicos que não ditos para que estão presente a todo momento.  Ou seja, por mais que possa ser bem fundamentada a necessidades de se utilizar determinadas ferramentas para o pensamento, ou por mais que seja necessário tal máquina, o livro, o autor, a didática. As vezes, ele pode não servir para outras que fogem do sujeito imaginário daqueles que elaboraram um projeto para o outro. E nesse sentido existe críticas para os universais. E nesse sentido, temos um leque de possibilidades e especialidades do que e como fazer ou construir problemas de pesquisa, e processo de ensino e aprendizagem. Mas a forma a qual realizamos tal trabalho, é incontestavelmente, mediada por encontros, de sala de aula, cadeira,  lousa e o texto X de um autor geralmente europeu.

Nesse sentido continuo não podendo dizer que este é um trabalho. Pois a disciplina e de formação e se propôs a discutir outras temáticas. A não ser que transforme essa vontade de conhecer em objeto, fundamento. No entanto quem saberia realizar tal gesto de valor ? Entendem a experiência dos novos sujeitos, alunos e professores, que estão nesta universidade?

Enfim essas são perguntas que tenho me colocado. E, ao invés de, realizar trabalhos que têm como objetivo sistematizar o pensamento dos autores, ou os aprendizados da disciplina. Utilizo esse espaço para abrir dialogo com os docentes. E elaborar uma outra convivência que não seja apenas mediada por currículos, ou bloqueada pela representação imaginária que fazemos do outro, como não humanos, aluno ou professor. Hannah Arent entende como não humana a vida que decorre em função da mera satisfação de necessidades, desprovida das condições que possibilitam aos homens criar alguma forma do novo.

O que podemos lembrar dos acontecimentos em 2012 em nossos campus? O que continuamos repetindo? E é possível elaborar tais acontecimentos em um cenário de crise das universidades no brasil?

 

                                                       Perceptos cantados

              Para Nietzsche,  a memória é uma doença. O tempo não pode ser detido, a vontade não pode “querer para trás”, isto é, corrigir o curso de suas escolhas passadas. O ressentimento, para Nietzsche, é uma característica dos fracos; tem parentesco com a covardia moral a que se refere Freud. O ressentido, para Nietzsche, vê em tudo aquilo que o oprime e fere, o “mal” no sentido moral, e em contrapartida elabora a imagem de si mesmo como “bom”. Assim, o ressentido, em vez de fortalecer-se e lutar, sente-se moralmente autorizado a demandar do seu opressor que não seja forte. O ressentido, escreve Nietzsche, sofre de uma memória reiterada, de um impedimento a esquecer. O que ele não pode esquecer? O agravo. Por isso, não pode entregar-se ao fluxo da vida presente.

No texto, “memória e (res)sentimento: Indagações sobre uma questão do sensível” as autoras abordam o ressentimento preocupadas com a repetição que Benjamin demonstra em uma das suas obras. Como se fosse necessário repetir, viver uma ditadura novamente, ou sentir o que é uma ditadura. Assim como a ideia do fim da narrativa tradicional, trazida com as memórias traumáticas. Faz com que tenha um corte, uma dificuldade na lembrança e elaboração do que foi a ditadura. Pois o trauma gera perda ou declínio de experiência. Experiência de compartilhada com a comunidade humana, de pai para filho tais experiências com o mundo.

Para Freud recordar, seria colocar-se a tarefa do pensamento espontâneo, na clínica tratar daquilo que o paciente, ou o investigado, propõe, focar no trabalho, e utilizar a interpretação essencialmente para reconhecer as resistências que nela surgem e torná-las conscientes para o doente. Preenchimento das lacunas da recordação e superação das resistências da repressão.  Ele descreve o procedimento clínico como uma observação da experiência: de esquecimento das impressões, cenas, vivências reduz-se em geral a um “bloqueio” delas.

Utilizei os vídeos produzidos no ato pela permanência da EFLECH, publicados por três perfis diferentes. Para lembrar minhas impressões e vivências em 2012. E é realmente difícil aceitar o lugar que fazemos parte. O vídeo, são imagens em movimento deste dia, em que eu estava presente. Mas ele me trás outras vozes que eu não havia escutado. Outras pessoas que não tinha visto. E obviamente, pensar outros em perspectivas diferentes do que naquele momento. E isso não anula o lugar que cada um ocupa no acontecimento. Mas o deslocamento acontece, como se tanto fosse outra a olhar para aquele vídeo. Como as imagens trazem focos que eu desconhecia.

Também recorri a textos de três diferentes fontes. Uma fonte foi o blog da greve, produzido pelos grupos que compõe o movimento estudantil. Neste há uma análise deste ato como uma manifestação de repressão aos estudantes e aos movimentos sociais. Com o argumento que “Por trás do “ato em defesa da EFLCH”, no entanto, está a política da reitoria de tentar acabar com a ocupação e a greve e, o que é mais grave, de tentar legitimar uma possível ação repressiva contra o movimento estudantil“[1]. Nesse sentido convocam um ato em resposta para que não ocorra uma desarticulação da ocupação.  Já no blog, Pimentalab[2], um projeto de extensão, encontramos um texto com fotos, de impressão positivas sobre o ato, como um espaço que possibilitou que os três setores. Professores, alunos e funcionários pudessem compartilhar suas vozes. No site, pelo departamento de comunicação  institucional da UNIFESP, o ato é celebrado como um espaço importante para “reestabelecer no campus o clima de harmonia, respeito ao diálogo e pluralidade que devem caracterizar a vida acadêmica.”[3]

Dias depois, lembro me que ocorreu um confronto direto entre professores e alunos. Porque alguns professores decidem tirar os piquetes feitos pelos alunos que estavam barravam as salas de aula. E os piquetes eram vistos pelos alunos como uma forma de garantir a deliberação tanto da greve, como da ocupação. Esse ação dos dois sujeitos, construiu um conflito que gerou violências verbais e físicas de uma categoria contra a outra. Quero não me esquecer deste momento. Pois esse  foi um acontecimento chave, onde observei que o que estava em disputa não eram os discursos que que rodeavam tanto os professores quando os estudantes. Pois a nossa ação não estava mais mediada   por diferentes discursos. Porque ambos os grupos não se falavam e nem se ouviam. Estávamos mediados pura e simplesmente por imagens representativas do ser professor e do ser estudante. Que   depois, se tornou dentro da limitação da ideia de política clássica amigo-inimigo. Um grupo deve   combater o outro, e perde-se a possibilidade de nós vermos como humanos, iguais na ação com as diferenças discursivas.

E isso acompanhado da perca total de convivência entre professores e alunos. Hannah Arent aponta que “De qualquer modo, desacompanhados do discurso, a ação perderia não só o seu caráter revelador como e pelo mesmo motivo, o seu sujeito por assim dizer: Em lugar de homens que agem teríamos robôs mecânicos a realizar coisas que seriam humanamente incompreensíveis”. Um exemplo, disso é porque o conflito se instaurava no campus sendo que estava dentro de uma conjuntura nacional de greve. Onde o que se problematizava eram pautas de ambas as categorias. E além disso a distancia entre esses sujeitos realmente se dá pela posição institucional que estas tenham? Ou seja, há alguma coisa a mais que ligue os estudantes além de categoria estudantil que é uma representação institucional para o conjunto de pessoas matriculadas nesta universidade? E a mesma pergunta é possível fazer o conjunto de professores?

Hannah Arent, também apresenta uma ideia de homem do futuro. Como aquele incapaz de realizar um estado de presença a tal ponto de não mais compreender sua própria existência. E este seria um problema político, atrelado ao processo de produção de verdade, da própria ciência. Assim como de uma confusão humana profunda, cito “ Seria como se o nosso cérebro condição material e física do pensamento não pudesse acompanhar o que fazemos de modo que de agora em diante, necessitaríamos realmente de máquinas que pensassem e falassem por nós. Como é possível que os corpos quando se encontram, estejam bloqueados a realizar um reconhecimento humanos no outro?

Para Freud a elaboração se dá na relação entre o lembrar e o esquecer. No filme, “Que bom te ver viva” mulheres que foram presas políticas e foram violentadas pelo estado militar narram sua experiência, só uma das narrativas é realizada por uma atriz. O filme foi produzido em 89, todas as narrativas dessas mulheres é possível notar que elas prosseguiram suas vidas, algumas delas realizam trabalhos cotidianos ligados ao processo de lembrança de forma mais direta, como é o caso de uma que continua sendo ativista. O filme mostra como cada um delas colocou em alguma atividade essa possibilidade de lembrar e se esquecer, uma na maternidade, no ativismo. É interessante a personagem que narra a história interpretada pela atriz Irene Ravache, ela narra aquela que escolhe não esquecer, ressentir. E na última cena do filme fica claro que o fluxo da vida desta está interrompido, pois ela narra sempre a partir do quarto. E seus desejos de se encontrar com alguém permanece bloqueados pela imaginação e fantasia.

Na obra de Maria Rita Kehl ela Anália o ressentimento como um afeto que marca a sociedade brasileira. Mas o impasse não esta naquele que ressenti mais sim nas características geradas pela construção do sujeito político que esta sempre reivindicando sua sobrevivência em  um local, ou seu níveis de mutabilidade. Cito:

 

“A vida nua produz uma espécie grave de abatimento e resignação, mas não o ressentimento. Este é o afeto característico dos impasses gerados nas democracias liberais modernas, que acena, para os indivíduos com a promessa de um igualdade social que não se cumpre, pelo menos nos termos em que foi simbolicamente antecipada. Os membros de uma classe ou de um segmento social inferiorizados só se ressentem de sua condição se a proposta de igualdade lhes foi antecipada simbolicamente, de modo a que a falta dela seja percebida não como condenação divina ou como predestinação – como nas sociedades pré-modernas – mas como privação. São os casos em que a igualdade é oficialmente reconhecida, mas não obtida na prática que produzem o ressentimento na política.”

 

 

                                                      Uma experiência

Acompanhei na experiência de quase uma vida inteira de educação formal. Que alguns bloqueios realizados pela imagem que fazemos do outro. Acontece pela  representação simbólica daquele que sempre lhe dirá o que deve ser feito.  A figura dos professores é representado “daquele que sabe de tudo”. Em 2012 quando me deparei com uma crise institucional e com os acontecimentos na universidade, onde ocorreram as disputas de projetos políticos. E inclusive os dispositivos de segurança do estado, a polícia, foi chamada pelo próprio diretor acadêmico que é um professor. O que discordo completamente. Ao mesmo tempo que essa imagem do professor que aprendemos, em no mínimo onze anos de ensino básico, foi sendo paulatinamente desconstruída. Fiquei altamente surpresa que alguém que estuda pedagogia possa ter chamado a polícia para estudantes. Ao mesmo tempo que fiquei surpresa comigo quando chegou em um nível de esgotamento absurdo de greve. E não mais conseguia ver os professores como pessoas e sim como inimigos.

E faço a análise que o interromper a convivência dos iguais com os diferentes discursos no mesmo local acordou muitos traumas, tanto da escravidão, guerras e ditaduras. Constantemente sonhava com esse contextos.  Penso que a não elaboração coletiva do que tenha sido o fascistas, as ditaduras e o totalitarismos. Faz com que estes estejam em nós, recalcados. Prontos a maquinar nossos desejos, escondido nos discursos. Assim como impossibilita a  construção de novas formas de vida, de relação, de si e com o outro, e inclusive com o conhecimento.  E sei que não é possível realizar tal elaboração enquanto ainda existir a polícia militar.

pm- twiter reintegração [4]

O que realmente é autoritário? E o que é violência?

[1]http://greveunifesp.wordpress.com/page/55/ (visualizado dia 21/08/2013)

[2]https://pimentalab.milharal.org/2012/06/05/impressoes-do-ato-pela-eflch/  (visualização no dia 21/08/2013)

[3]http://dgi.unifesp.br/sites/comunicacao/index.php?c=Noticia&m=ler&cod=4c94dd01 (visualização no dia 21/08/2013)

[4]Reintegração de posse da diretoria acadêmica. Como será possível elaborar alguma coisa. Se para sentir o passado em nossa democracia altamente militar, ou recebemos uma bala de borrada, porque estudantes privilegiados. E no caso de moradores das periferias as balas são de metal mesmo.

[5] Este texto foi escrito como trabalho final da disciplina memória, politica e cinema. No segundo semestre de 2013.

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